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segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Doenças do século 19 ainda são desafios para a saúde pública

Aline Leal Valcarenghi
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O mesmo Sistema Único de Saúde (SUS) que fez mais de 22 mil cirurgias de transplantes de órgão e lida diariamente com doenças relacionadas a um novo estilo de vida imposto pela modernidade do século 21 - corrido e ao mesmo tempo sedentário -, ainda precisa prestar atendimento a pessoas com enfermidades que se expandiram desde o século 19. De acordo com a pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Tânia Araújo Jorge, as chamadas “doenças negligenciadas” têm um determinante social muito forte e suas sequelas alimentam o círculo da pobreza.

“Renda, condições de educação, de saneamento e água influenciam bastante na permanência dessas doenças, por isso são consideradas doenças relacionadas à pobreza”, explica Tânia. As doenças negligenciadas consideradas prioritárias pelo governo federal são dengue, doença de Chagas, leishmaniose, malária, esquistossomose, hanseníase e tuberculose. A pesquisadora destaca que outra característica desses males é que, de forma geral, são negligenciados pela indústria farmacêutica global. “Não tem interesse em investimento de pesquisa para geração de vacina, de medicamentos, porque é um mercado pobre, a atividade econômica não dá sustentação para um mercado global” avaliou.

Tânia Araújo acrescenta ainda que outro componente que contribui para a permanência dessas doenças na agenda do governo é a omissão da rede pública de saúde na atenção a essas populações. “Muitas vezes você tem o medicamento, mas o serviço de saúde não propicia o acesso às soluções já conhecidas”, diz.
A pesquisadora ressaltou que não adianta ter apenas um planejamento do governo federal, “tem que haver ação na ponta. A articulação entre os entes federal, estaduais e municipais é muito importante”. Para ela, as políticas voltadas para a as doenças negligenciadas são tratadas como política de governo e não de Estado, e por isso é muito comum que sejam suspensas a cada troca de governo.
“Esse tema não deve sair da agenda política, ele está muito presente na agenda dos cientistas, mas isso por si só não é o suficiente. Os resultados das pesquisas têm que ser colocado na agenda política do país” frisou Tânia, acrescentando que o investimento em educação é fundamental.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, em 2012 foram registrados mais de 33 mil novos casos de hanseníase, considerada uma das doenças mais antigas que acometem o homem e que tem cura. Os estados de Mato Grosso, Maranhão e do Tocantins apresentaram em 2012 alta incidência da doença, enquanto todos os estados da Região Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, na Região Sudeste, somados ao Rio Grande do Norte, no Nordeste, alcançaram a meta de eliminação da hanseníase como problema de saúde pública.

A pesquisadora explicou que com o avanço das pesquisas na saúde a letalidade das doenças negligenciadas diminuiu em relação à do século 19, porém, a convivência prolongada com elas traz mais morbidades. “A mortalidade hoje no Brasil é muito mais causada por doenças cardiovasculares, câncer, doenças crônicas. Essas doenças infecciosas da pobreza conseguem ser controladas, menos de 5% da população morrem em consequência delas. No entanto, elas são muito frequentes, em crianças atrapalham o rendimento escolar, atrapalham o crescimento, em adultos atrapalham a inserção no mercado de trabalho, de forma que sustenta um círculo que mantém a pobreza” diz a especialista.

Ao mesmo tempo em que o SUS precisa lidar com essas doenças, aumenta o número de pessoas acometidas por males intimamente relacionados ao ritmo de vida mais acelerado, às cobranças e ao sedentarismo, cada vez mais comuns na vida de quem vive nas metrópoles. “Obesidade, hipertensão arterial, diabetes mellitus, depressão, problemas de tireoide, dor nas costas, doenças ocupacionais, são as doenças que mais atormentam a sociedade moderna”, avalia Samira Layaun, médica especialista em medicina preventiva e consultora de saúde e qualidade de vida.
Na avaliação da especialista, falta estrutura e investimento em saúde pública para atender à demanda ocasionada por essas doenças. Mesmo figurando em agendas de saúde tão distintas, tanto as doenças negligenciadas como as ditas “da vida moderna” precisam de investimento maciço em educação.

“O governo deveria investir mais em campanhas educativas e ações que estimulem as pessoas a adotar bons hábitos alimentares, de sono, exercícios, entre outros. De outro lado, as pessoas deveriam aderir a esses bons hábitos. Procurar alimentar-se e hidratar-se corretamente, dormir, no mínimo, oito horas por noite, praticar exercícios com regularidade, manter o peso e o estresse sob controle, ficar longe do cigarro, do álcool, das drogas, praticar boas ações e nutrir bons sentimentos. São práticas que colaboram tanto na prevenção como no tratamento das doenças da vida moderna”, reforçou Samira à Agência Brasil.
 




Doença
Descrição do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Inovação em Doenças Negligenciadas – Ligada à Fundação Oswaldo Cruz
Incidência de acordo com o Ministério da Saúde
Esquistossomose:
A esquistossomose, também conhecida como bilharzíase ou "febre do caramujo", é uma doença parasitária, transmitida por caramujos infectados com uma das cinco variedades do parasita Schistosoma. A infecção tem ampla distribuição no hemisfério sul, com uma relativa baixa taxa de mortalidade, e alta morbidade, que debilita milhões de pessoas ao redor do mundo.
O maior registro da doença está na Região Nordeste, especificamente em Pernambuco. Em seguida, aparece a Região Sudeste, com maior índice em Minas Gerais. Já a Região Norte não apresentou registro da doença em 2012. Os registros do Ministério da Saúde apontavam 31.744 casos esquistossomose em 2012.
Hanseníase:
Doença infecciosa causada pelo bacilo Mycobacterium leprae que afeta os nervos e a pele e que provoca danos severos. É transmitida por gotículas de saliva. É endêmica em certos países do Hemisfério Sul, principalmente na Ásia.
Os estados de Mato Grosso, Maranhão e do Tocantins apresentaram, em 2012, coeficientes de prevalência altos - entre 5 e 9,99 casos por 10 mil habitantes -, enquanto todos os da Região Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, na Região Sudeste, somados ao Rio Grande do Norte, no Nordeste, alcançaram a meta de eliminação da hanseníase como problema de saúde pública.
Em 2012, o registros do Ministério da Saúde apontavam 33.303 casos de hanseníase.
Dengue:
Dengue e a febre hemorrágica da dengue (FHD) são causadas por quatro sorotipos do vírus. A infecção é mais comum nas Américas e na Ásia e em outras regiões tropicais e é transmitida ao homem pela picada de mosquitos infectados. Os sintomas incluem dores de cabeça, febre, dores nas juntas e músculos
A transmissão de dengue foi mais intensa na Região Sudeste com 875.457, seguida pela Região Centro-Oeste com 261.541 (os números são referentes ao período de 30/12/2012 a 6/7/2013).Em 2012 houve mais de 590 mil casos de dengue no Brasil.
Doença de Chagas:
A doença de Chagas só é encontrada na América Latina. É a infecção causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi. Muitas vezes na fase inicial a doença não apresenta sintomas, mas quando aparecem podem ser febre, mal-estar, falta de apetite, dor ganglionar, inchaço ocular e aumento do fígado e baço, entre outros. Atualmente, os casos têm ocorrido principalmente na região amazônica, em especial no estado do Pará, devido à ingestão de alimentos contaminados com o Trypanosoma cruzi, parasita causador da doença. Nas outras regiões, a principal forma de transmissão era a vetorial, quando o inseto transmissor, o barbeiro, infestava e colonizava o interior dos domicílios. Hoje, essa forma de transmissão está interrompida, ocorrendo casos de maneira esporádica, principalmente devido à proximidade com o ciclo silvestre da doença. A estimativa é que no Brasil há entre 2 e 3 milhões de pessoas com a doença.
Malária
A malária é considerada uma das mais graves infecções parasitárias da humanidade. Presente em 110 países, a doença ameaça metade da população mundial. A cada ano surgem de 350 a 500 mil casos, principalmente no Continente Africano. Causada pelo parasita Plasmodium, a malária é transmitida de pessoa a pessoa por meio da picada de mosquitos Anopheles.
Amazonas e Amapá são os estados que apresentam maior número de casos.
Tuberculose:
Doença infectocontagiosa causada por uma bactéria que afeta principalmente os pulmões, mas, também pode ocorrer em outros órgãos, como os rins, e tecidos, como os ossos. É causado pelo Mycobacterium tuberculosis ou bacilo de Koch (BK). Aproximadamente um terço da população do mundo está infectada com o bacilo da tuberculose, que é a principal causa de morte de pessoas que estão infectadas pelo HIV, devido ao enfraquecimento das defesas imunológicas.
Os estados de maior incidência são Amazonas e Rio de Janeiro com 67,3 casos por 100 mil habitantes. Já os locais com menor incidência são o Tocantins e o Distrito Federal com 13, 5 casos por 100 mil habitantes. No momento, Cuiabá é a capital com maior incidência, com 100 casos por 100 mil habitantes. A capital com menor índice é Palmas, com 9,5 casos por 100 mil habitantes. Números de 2012 mostram o registro de 71.230 pessoas com tuberculose.
Leishmaniose:
Doença causada por protozoários parasitas do gênero Leishmania transmitida por meio da picada de certas espécies de flebotomíneos. Os sintomas da infecção incluem feridas na pele, febre, anemia e danos ao fígado e baço. A forma mais grave da doença, a leishmaniose visceral, ocorre quando os parasitas migram para os órgãos vitais. Atualmente, cerca de 90% dos casos de leishmaniose na América Latina ocorrem no Brasil.
A Região Norte apresenta a maior incidência, sendo o Tocantins o estado com maior concentração da doença. Em seguida, aparece a Região Nordeste, com casos registrados no Maranhão, Piauí e Ceará, respectivamente. Números de 2012 mostram o registro de 3.043 pessoas com tuberculose.
Edição: Marcos Chagas

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